terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Champagne, o original

Uma mágica conjunção de fatores contribui para que só o (autêntico) champagne tenha condições de reunir equilíbrio e elegância, suas grandes características. A razão principal desse diferencial chega a desafiar o que se entende como um local ter vocação para produzir bons vinhos. São condições extremas: é a região vinícola mais setentrional da França - está no paralelo 49 -, o que implica em temperaturas médias anuais que mal chegam a 11 graus centígrados, muito baixas para se atingir graus adequados de maturação das uvas. Leve-se em conta ainda que a insolação é de apenas 1650 horas ao ano, contra 1910 da vizinha Borgonha (que cultiva as mesmas castas) e 2070 de Bordeaux, só para buscar exemplos dentro do país. A questão é que não se trata de brancos ou tintos, mas de espumantes e aqui guardar o frescor é fundamental.
Fundamental, mas não suficiente; é preciso ter adequada estrutura para lhe dar equilíbrio. Entra em cena outra particularidade da região: o solo, que parece giz. Característico da região de Champagne, o gesso atinge camadas espessas do seu subsolo, colaborando sobremaneira para compensar as carências climáticas. O gesso, por conseguir absorver 40% de seu volume em água, funciona como regulador hídrico das parreiras, acolhendo o que cai a mais durante o período de chuvas e restituindo no período de seca. Outra vantagem desse solo é a capacidade de armazenar o calor do sol e irradiá-lo gradualmente de tal forma a proporcionar uma maturação regular dos cachos.
Se esse conjunto de fatores faz entender porque o champagne é soberano e inimitável no gênero, até sua "descoberta" a região tinha pouca expressão no cenário vinícola da França, tentando competir sem muito sucesso com a Borgonha em vinhos tintos e experimentando elaborar brancos. As condições climáticas, impedindo boa maturação das uvas, resultavam em vinhos ácidos e pouco alcoólicos, além de invariavelmente bloquearem o processo de fermentação. As borbulhas viriam a se formar mais tarde, com o aumento da temperatura na chegada da primavera - daí a frase "estou bebendo estrelas", atribuída ao monge beneditino Dom Perignon, considerado o "inventor" do champagne.
Jorge Lucky, Jornal Valor, 9 de Dezembro 2008

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